Nova academia de pintura

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Nova academia de pintura - dedicada às senhoras portuguezas que amão ou se applicão

Title: Nova academia de pintura Subtitle: dedicada s senhoras portuguezas que amo ou se applico ao estudo das Bellas Artes Author: Cirilo Volkmar Machado Release Date: March 15, 2008 [EBook #24833] Language: Portuguese Credits: Produced by Rita Farinha and the Online Distributed Proofreading Team at http://www.pgdp.net (This file was produced from images generously made available by National Library of Portugal (Biblioteca Nacional de Portugal).) Nota de editor: Devido quantidade de erros tipogrficos existentes neste texto, foram tomadas vrias decises quanto verso final. Em caso de dvida, a grafia foi mantida de acordo com o original. No final deste livro encontrar a lista de erros corrigidos. Rita Farinha (Mar. 2008) NOVA ACADEMIA DE PINTURA DEDICADA S SENHORAS PORTUGUEZAS Que amo ou se applico ao estudo das Bellas Artes. ....las Mugeres quando Talves, applicar se han visto A las Letras, o las Artes, Los Hombres han excedido. LISBOA: NA IMPRESSO REGIA. ANNO 1817. Com Licena. [3] PROEMIO. Quando vou discorrer sobre a Arte da Pintura, parece que deveria comear pelo seu elogio; mas no o farei, por me parecer cousa superflua, e bem sabida de todos: observarei smente, que a Arte por si s, inda que fosse levada a hum alto gro de perfeio, no poderia fazer illustre, e estimavel aquelle que tivesse o odioso, ou ridiculo comportamento de hum Brouwer,[1] de hum Aleixo Transpadano,[2] ou de hum Bufalmaco;[3] [4] mas se pelo contrario, algum soubesse ajuntar honra, e virtude os talentos de Rafael, de Corregio, ou de outro grande Pintor, estas raras qualidades assim reunidas, constituirio (diz Richardson) hum mortal cujo esplendor poderia luzir mito, mesmo em hum mundo ainda melhor de que este. Na Poesia no se admittem medianias; mas na Pintura ha tantas e taes difficuldades a vencer, que O Pintor de segunda ou terceira classe merece o mesmo gro de estimao que hum homem de primeira ordem em qualquer outra Faculdade. Mas se esta scientifica Arte, pela sua belleza e profundidade, tem sido digna da applicao de muitos homens da mais alta esphera, no deixa ella tambem, de ser igualmente propria, ou talvez mais propria ainda, para as Senhoras; principalmente naquelles [5] casos em que so mais necessarias a graa, e a delicadeza: assim, tem feito as Naes conhecedoras o maior apreo das obras da Sirani, da Sophonisba, da Rosalba, e de muitas outras, cujos nomes fazem tanta honra ao bello Sexo, como s suas patrias. A Musica he huma arte angelica, e pode entreter deliciosamente qualquer Senhora, huma ou duas horas cada dia; a leitura a divertir tres ou quatro; mas a Pintura faz parecer pequenos os maiores dias de Junho, e torna amavel e apetecivel a mesma solido: he huma arte no s imitadora de toda a Natureza, mas tambem creadora; arte emfim, que sympathisa grandemente com a vivacidade das pessoas espirituosas, e discretas, muitas das quaes desejo saber pintar, e nem sempre o conseguem; ou por viverem em terras aonde no ha quem as ensine, ou por se limitarem nas lies a huma pratica mui superficial. A Pratica he de absoluta necessidade, e por ella se deve no [6] s comear, mas avanar muito, sem nunca a perder de vista; porm ha huma baliza, alm da qual seno podem fazer ulteriores progressos sem estudar a fundamento os preceitos theoricos. Os Poetas, e Oradores tem as suas regras fundamentaes, escritas por bons Authores; ns tambem temos as nossas: o numero dos Escriptores que as trato he muito grande; os idiomas em que correm impressas so mui diversos; e he assaz difficultoso poder fazer dellas huma sufficiente colleco; e quando se fizesse serviria talvez, mais para confundir a mente de hum principiante, que para a illustrar. Ha em taes livros muitas cousas inuteis, e outras que parecem, ou so contradictorias; por tanto he preciso escolher, resumir, e concordar: he o que ns procurmos fazer nesta pequena obra, extrahindo de muitas flores, como fazem as abelhas, s o balsamo que he proprio para compor o mel; pondo de parte quanto nos pareceo improprio, ou desnecessario. [7] A Praxe, como dissemos, he indispensavel aos Artistas; mas a theoria he indispensavel perfeio da mesma pratica. Ella nos manifesta em pouco tempo as descobertas de muitos seculos. Desde que os restaudores da Arte comero a fazer alguns progressos, cuidro logo em ir estabelecendo, como maximas fundamentaes, as verdades que foro descobrindo; e para que ellas fossem bem apuradas e debatidas, antes de se adoptarem, e bem interpretadas depois de estabelecidas, fundro Academias, compostas dos mais sabios Artistas daquelles tempos; e s especulaes mais e mais apuradas dos seus Academicos, he que se deve a perfeio a que chegou a Arte no tempo de Raphael: e como a doutrina da nossa nova Academia he derivada, e recopilada das doutrinas de todas ellas, no ser fra de proposito dizer de passagem alguma cousa a respeito das mais notaveis. Tendo-se perdido a Arte, nos seculos [8] que as invases dos Godos fizero barbaros, e infelices, s em Constantinopla, aonde elles no entrro, se conservou huma sombra della, que no seculo XI. comeou a diffundir-se pela Italia. Pelos annos 1000 foro alguns daquelles chamados Pintores, fazer de Mosaico, o coro da Igreja de Santa Miniata em Florena: por 1072, sendo Doge de Veneza, Domingos Contarino, foro outros Gregos de Constantinopla ornar tambem de Mosaico a igreja de S. Marcos: hum seculo depois o Abbade Joaquim fez pintar sobre a porta do Thesouro, como por inspirao, os retratos de S. Francisco, e S. Domingos, que ainda no ero conhecidos: os Annaes de Sena fazem meno de alguns estatutos da Arte no seculo XIII.; mas huma das mais antigas sociedades de Artistas, foi a dos Padres Gaudentes, em Florena, no fim do mesmo seculo; muitos dos quaes bordavo, escrevio bem, miniavo, e pintavo. Gioto, no principio do seculo XIV. [9] fundou a primeira Academia das tres Artes, em Florena; e Jacomo Casentino concorreo muito para se erigir a Irmandade de S. Lucas em Santa Maria a Nova. A Pintura fazia progressos; e quando as Artes sobem, os discipulos excedem os mestres: Thaddeo Gaddi excedeo seu mestre Gioto, no colorido, e nas expresses: Paulo Ucllo fez grandes progressos na perspectiva: Pedro Cavallini, e Fr. Joo Angelico dero hum r muito devoto s Santas Imagens:[4] o Massolino[5] deu grande nobreza s figuras, e huma certa vida aos olhos; mas o seu discipulo Massacio excedeu-o tanto, quanto elle havia excedido os outros; porque deu muita fora de relevo, muita correco, [10] graa, e bellas attitudes s personagens que pintava; e pde-se dizer que abrio o templo da Immortalidade a Miguel Angelo, e a Raphael. Loureno de Medicis estabeleceo no seu Palacio, e Jardim, huma destas Universidades, ou Academias, bem provida de preciosos Cartes, desenhos, quadros, e estatuas; e dava premios, e penses aos estudantes mais aproveitados. Dalli sahio o Buonarota, o Torrigiani, o Ghirlandro, e outros sabios. Fr. Joo Angelo, que era bom Escultor, obteve o beneplacito, e a proteco do Gro Duque, para se restabelecer a antiga Academia, e a Irmandade de S. Lucas, j quasi extinctas, no Convento dos Anjos, e depois em S. Loureno. Em quanto isto se passava em Italia, tambem se fundro iguaes estabelecimentos quem dos seus montes, taes como o de Antuerpia, o de Nuremberg, o de Bruxellas, etc.; sendo hum dos mais antigos o de [11] Bruges, aonde Joo Van-Eych no seculo XIV. inventou a pintura a oleo. No principio do seculo XVI. erigio em Roma, o divino Raphael, a mais douta Universidade da Pintura que viro os modernos; mas durou pouco tempo; porque faltou o Reitor della em 1520, e os alumnos todos se dispersro, sete annos depois, quando o exercito do Condestavel Carlos de Borbon saqueou aquella Capital: porm Gregorio XIII, fundou outra, em considerao do Musiano, e do Zucaro, que a dotro. Os seus Academicos edificro o Templo de S. Lucas, e Santa Martinha, hum dos mais bellos e mais sumptuosos de Roma, pelos desenhos do famoso Pintor Pedro de Cortona; o qual lhe deixou 200$000 cruzados para se construir o Altar mr, de bronzes e marmores finos, e se lhe erigir hum mausolo.[6] O [12] Painel da dita Capella mr, o qual representa S. Lucas retratando Nossa Senhora, he de Raphael. Pela Lombardia fez a Arte grandes progressos, e teve boas Academias em Milo, Veneza, Mdena, Parma, Bolonha, etc. A dos Caraches foi a mais clebre, pela quantidade de grandes homens que della sahio. Alli se estudavo as tres Artes, a gravura, a perspectiva, e a anatomia: era provda de esqueletos, manequins, gessos originaes, vestidos, armas, arnezes, etc. Alli se distribuio lugares, empregos, e premios, tudo debaixo da direco de Luiz Carache. Depois desta houve tambem em Bolonha a do Guido, que teve 200 discipulos, a do Albani, a do Pasinelli, a do Conde Cignani, as do Conde e do Senador Ghisiliere, e outras muitas; mas como todas ero de particulares, depressa se extinguio. Em [13] Julho de 1706, juntro-se 80 ou 90 Pintores (entre os quaes, diz Zanoti, havia alguns que tinho o seu merecimento) na Galeria do Conde Fava, que sabia pintar, e tinha boa colleco de pinturas, a fim de buscarem meios para reprimir a ousadia de certos artigiani intrusos, que abusando da illimitada liberdade da Pintura, em hum paiz aonde no havia Academia, se incumbio da direco de grandes emprezas, e reduzio os habeis artistas a huma abjecta servido. O resultado foi que o dito Conde, o General Marsili, e Carlos Maratti obtivero do Papa Clemente XI., que se estabelecesse a desejada Academia de Pintura, e fosse alojada, com a Filosofia, no Palacio do Instituto de Bolonha, debaixo da Proteco de Santa Catharina de Vigri, religiosa de S. Domingos, e Pintora Bolonheza. Os Authores Francezes fallo em desenhos seus, feitos penna no seculo XII., com estylo nada inferior [14] ao que depois usou Cimabue:[7] e nos tempos de Gioto, tinho j muitos daquelles que alli se chamo barbouilleurs, formado huma corporao, mecanica sim, mas muito privilegiada pelo Parlamento; e em virtude dos seus privilegios ousro incommodar os grandes Pintores, que apparecero no tempo de Luiz XIV. Estes, indignados contra a sua audacia, fundro a Academia Real de Pintura, e Esculptura, que em 1663 foi dotada com 4$ libras annuaes; mas Luiz XVI. lhe condeo 10$. Mr. Urry, director das obras Reaes, em 1737, inventou o chamado Salo; lugar aonde de dois em dois annos, os Artistas expem ao Publico as melhores obras que vo fazendo; cousa que foi mui vantajosa [15] Arte. No lhe foro menos uteis os que se chamo quadros de Maio: os Ourives comero em 1449 a offerecer a Nossa Senhora com grande solemnidade, hum ramo verde, a que chamavo o Maio: depois, juntro aos ramos certas maquinetas; e por fins, desde 1630 comero a offerecer cada anno, hum painel, feito sempre por algum dos melhores Pintores da Frana. Luiz XV. estabeleceo o grande Concurso da Academia Real em Pars, sendo o premio dos vencedores, a sustentao em Roma (aonde tem outra Academia) por tempo de quatro annos, para se aperfeioarem. Na Hespanha fundro-se tambem varias Academias; mas a mais famosa foi a de Sevilha, aberta por Morilho em 1660. A de Madrid estabeleceo-se muito mais tarde pelas dissenses dos mesmos Artistas. O partido dos menos habeis, que era m Na Hespanha fundro-se tambem varias Academias; mas a mais famosa foi a de Sevilha, aberta por Morilho em 1660. A de Madrid estabeleceo-se muito mais tarde pelas dissenses dos mesmos Artistas. O partido dos menos habeis, que era muito maior, triumphou por mais de 120 annos, at o de 1744; tempo em que Philippe V. mandou absolutamente [16] que se fundasse. Fernando VI., dois annos depois, a dotou em 12$ pezos; e exaltou-a extraordinariamente, e aos seus professores. Inda que estas mimosas Artes sejo mui pouco fecundas nos climas frios, tem-se estabelecido as suas Academias na Dinamarca, na Russia, e por todo o Norte da Europa. Os Pintores Inglezes tambem se associro em S. Martin's-lane em 1750, a fim de deitarem os fundamentos n'huma especie de Academia: dez annos depois conviero em fazer huma exhibio publica das suas melhores obras, em hum salo similhante ao de Frana, aonde se entraria por dinheiro. Em 65 obtivero o beneplacito Regio para se estabelecerem; e em 68 teve a Sociedade o titulo de Academia Real das tres Artes. O dote era o producto das exhibies; mas como nos primeiros annos no chegasse para as despezas, supprio o bolsinho Real a falta de 45$ cruzados. Os Artistas expem venda, ou [17] censura pblica, naquelle Salo, as obras que querem; e os curiosos que as pertendem ver, pago pela entrada hum xelim cada hum: estas entradas produziro 13 a 14$ cruzados annuaes at o anno 1779; mas no seguinte, que foi o primeiro da exhibio em Somerset-Palace, subio a receita a 27$ cruzados; e dalli at o anno de 96 andou sempre por 22 a 23$ de sorte que excedendo a receita a despeza, comprou a Academia huma boa propriedade, e applicou os seus rendimentos em beneficio dos Artistas precisados. Este estabelecimento, soffreo tambem, como todos os mais, grandes opposies; porque os no admittidos em a nova Academia, fundro outra; e outra exhibio; mas como no tinho grande credito, tudo desappareceo em pouco tempo. De todas estas, e outras famosas Eschlas, he que deriva a Doutrina, que em compendio vamos ensinar nesta nova Academia: mas antes de comear as lies, he preciso dar s [18] nossas illustres Academicas huma idea verdadeira da Arte. A Pintura pde ser considerada de duas sortes, ou como natural, ou como artificial. A Pintura natural he aquella que naturalmente se imprime na retina dos nossos olhos; e dalli, pelos nervos opticos, se communica alma; e a Pintura artificial, he a imitao da Pintura natural. A esta imitao, se he bem feita, chama-se Verdade. A Verdade na Pintura, ou he simples, ou ideal, ou composta de huma e outra: Verdade simples he a imitao exacta da Pintura natural, tal como ella se estampa dentro dos nossos olhos, com todas as suas bellezas, e defeitos: Verdade ideal, he a imitao daquellas imagens, que se nos represento na imaginao: Verdade mixta he a imitao da Pintura natural, emendada nos seus defeitos, pelos modelos de perfeio que o grande Artista concebe na sua mente. Esta verdade mixta, ou composta, he a que se acha nas obras de [19] Raphael, e de outros grandes homens; mas principalmente no Antigo.[8] Os que estudo a Arte devem, primeiro que tudo, adquirir a pratica da verdade simples, costumando-se a imitar perfeitamente tudo quanto se apresentar diante dos seus olhos; mas podem, e devem faze-lo de sorte que em virtude da boa escolha dos objectos, achem tambem nos seus exemplares a verdade composta. As Pinturas do Carache no palacio Farnesio, e as de Raphael no Vaticano so as duas grandes eschlas de Desenho. A terceira, e no menos importante para os que esto mais adiantados, he a das boas estatuas antigas: os que no puderem estudar pelos originaes, basta que estudem por exactissimas copias. [20] A Pintura comprehende tudo quanto se pde ver, e imaginar; e como he to vasta, divide-se em muitas partes, e em muitos generos. Os generos, so: 1. o Historico, ou (como os authores lhe chamo) o grande Genero: 2. o dos Retratos: 3. o das Batalhas: 4. o das Bambochatas: 5. o das Paizagens e Perspectivas: 6. o das Marinhas: 7. o dos Animaes: 8. o das cousas inanimadas, como flores, fructos, ornatos, quadraturas, etc. As partes de que se compe a Pintura, so: a Inveno; a Expresso; a Distribuio, ou Disposio; o Desenho; o Colorido; o Clar'escuro; o Estylo, ou Pincel; a Graa; a Grandeza; o bello Ideal; etc. etc.: mas todas estas partes se podem reunir debaixo de tres principaes chefes, que vem a ser: Composio, Desenho, e Colorido. Na ordem dos estudos praticos, comea-se pelo Desenho; mas na ordem da doutrina theorica principia-se pela Composio, por ser a primeira cousa que o [21] pintor habil tem a fazer quando quer comear o seu painel; motivo porque principiaremos tambem por esta parte o nosso compendio. [23] NOVA ACADEMIA de PINTURA primeira parte. Composio. Crear, ou para dizer melhor, reproduzir de novo as obras do Creador; renovar e perpetuar sobre hum painel os feitos heroicos, os acontecimentos memoraveis, he o mais nobre emprego do genio pitoresco. Dispr as idas em huma bella ordem, apresenta-las debaixo d'hum aspecto luminoso, he o grande primor da arte. Desta duplicada operao, da Arte, e do Genio, nasce a Composio. Os pensamentos so [24] os seus membros. Mas assim como os materiaes de hum edificio no o poderio formar, se no estivesse cada hum no seu lugar; assim as idas no representario bem huma passagem historica, seno estivessem distribuidas na composio do quadro, com sabia economia, e com reflexo magistral. A composio divide-se em Inveno, e Disposio. seco i. Inveno. A inveno he a combinao dos pensamentos que concorrem para a composio de qualquer assumpto: he huma Musa que sendo dotada de todas as bellas qualidades das suas irms, as Musas das Bellas letras, e inspirada pelo espirito de Apolo, vem por isso mesmo a ser mais elevada, e a resplandecer com mais viva [25] flamma: he hum talento natural que se no adquire pelo estudo, nem pela pratica; porque a fonte das invenes est na faculdade imaginativa, e requer tres cousas, imaginao, prudencia, erudio. No ha regras para a Inveno, porque a arte de imaginar no se communica; mas podem haver conselhos uteis. Racine, quando compunha as suas tragedias fazia todos os esforos para entrar nos sentimentos que queria dar a Hippolito, a Phedra, a Athalia, e a Esther. A Inveno he a poesia da Pintura, e a parte mais propria para descobrir o talento do artista: ella desenvolve a primeira ida de toda a obra; e o Pintor no a deve perder de vista at a ultima pincelada. No basta que elle encha hum painel com muitas e boas figuras, se estas no servirem todas para explicar o principal objecto; e se a totalidade da obra no declarar logo ao espectador qual he o assumpto de que se trata; preparando, e dispondo a mente de [26] quem v a pintura, para ser commovida com as expresses, e affectos das figuras principaes: sem o que, de nada serviria dar-lhes expresses violentas e exaggeradas, como fazem aquelles que querem affectar muito espirito. O excesso, ou affectao he a cousa mais nociva boa inveno. A Pintura sustenta-se, assim como a Poesia, pela fabula, e vive de fices; cada virtude se transforma n'huma divindade: Minerva he a Prudencia; Venus a formosura; Diana a castidade; cho no he hum som, he huma nympha; o cabo das tormentas no he hum promontorio, he o gigante Adamastor. Assim o Pintor, e o Poeta, orno e elevo todas as cousas. He tambem importante, associar escolha dos objectos todas as circumstancias, e todos os episodios, que podem augmentar o seu interesse; tendo porm muito cuidado em que os accessorios no prejudiquem em cousa alguma a aco principal. As particularidades relativas ao [27] costume devem ser exactamente observadas na Inveno: transportemo-nos em ida aos diversos paizes; chamemos nossa imaginao os passados seculos; occupemo-nos dos usos, costumes, e trajes de todas as personagens, para no cahir-mos naquelles anachronismos, que so capazes de tirar o merecimento ao quadro mais felizmente concebido, e executado. Tudo o que se chama original he inventado; mas nem tudo o que he inventado merece o titulo de original; porque esta palavra no s d ida de inveno, mas tambem de grande magisterio. Arrojar-se a inventar sem ter subido todos os degros da escada optica, he querer precipitar-se. Alguns desfiguro s vezes os seus pensamentos querendo enriquece-los. La o Pintor muitas vezes a historia que ha de compr, e quando estiver bem senhor della imagine as personagens: faa o desenho interno na sua ida; porque sem isso rascunhar [28] muito, e no far nada. Depois da composio mental, querendo passar execuo da obra, retire-se do tumulto; porque entre rumores, e estrpitos nada se far com acerto. No pinte seno quando se sentir excitado por hum certo impulso; porque a pezar das Musas no se pde fazer obra louvavel. A Inveno requer muito fogo, e muito genio; e a Disposio muita fleuma, e prudencia: e como estas cousas to oppostas raras vezes se combino, por isso tem sido raros os grandes Pintores. He porm mais facil moderar o genio de fogo, que escaldar o de gelo. Nem todos os pensamentos so proprios para formar huma intelligivel e elegante composio. Lucas Jordo rejeitou as Invenes dos sabios que por ordem de Carlos II. lhe davo assumptos Theologicos para elle executar no Escurial. Todos ero orthodoxos, discretos, eruditos; mas no ero capazes de fazer por elles huma bella e pittoresca composio: [29] portanto deve-se escolher hum assumpto nobre, e que seja susceptivel de bom colorido, graa, belleza, instruco, recreio, etc.: escolhendo, para o compor, o mais bello de toda a Natureza, segundo o gosto dos antigos, e dos modernos que melhor os soubero imitar. A escolha das Invenes deve ser analoga aos lugares que ellas vo ornar. Nas Casas Reaes convem as aces dos Principes, e dos grandes Capites; convm triumphos, victorias, e outros assumptos capazes de levantar o nosso espirito a pensamentos heroicos, e a desejos de honra, e de gloria. O grande Artista pde, e deve ser grato aos beneficios que recebe da Patria, dos Principes, e dos grandes Senhores: e se Virgilio immortalisou os Romanos, Cames os Portuguezes, e Homero os Gregos; tambem Raphael teve poder para perpetuar a gloria de Julio II., e Leo X.; Lebrun a de Luiz XIV.; e o Ticiano a de Carlos V. Nos Consistorios ecclesiasticos, [30] tem bom lugar a assembla dos Filosofos, ou o concilio dos Theologos; como fez Raphael no palacio Pontificio: mas nos seculares, no ser impropria a pintura do conselho dos Gregos para a expedio de Troya: a de Licurgo, Demosthenes, etc. Nos templos claros pode-se pintar S. Joo prgando turba; a absolvio da Adultera; a converso de S. Paulo; e outras passagens alegres: mas n'hum tribunal de Justia ser a proposito representar o juizo de Salomo; aquelles que se dedicro morte por amor das leis; e outros semelhantes. Nos jardins, ao p das fontes, no sero improprias as metamorphoses de Acteon, Arethusa, Salmacis, Narciso, e Egeria; mas entre os bosques Hippomenes, Atalanta, Meleagro, Marsyas, Apollo; os quatro tempos, e os mezes do anno; bailes de nynfas, e satyros; e tambem algumas perspectivas, e paizagens, com Cephalo, etc. Sobre as chamins das salas pintar-se-ha [31] Prometheu furtando o fogo do Ceo, Hercules na pyra, Ascanio com a flamma nos cabellos, Vulcano, Phaetonte, Perillo, Scevola, Curcio, Meda, Ceres procurando a filha, e outras. Os corredores ou galerias abertas, sendo nobres como so as lojas de Raphael, ou o Claustro do Escurial, podem ser enfeitados com elegantes ornatos, e arabescos, compostos de aves, flores, fructos, medalhas de estuque, paizagens, perspectivas, folhagens, animaes, insectos, monstros, figuras humanas, e tudo quanto cria a Natureza, e a ida pde imaginar. As galerias interiores, bem pintadas, so como preciosos volumes, sempre abertos, e escriptos em huma linguagem universal, que todos entendem; onde vemos descriptas as proezas de Luiz XIV.; a proteco efficaz que elle concedeo s Artes e Sciencias; as aces de Francisco I.; e tantas outras cousas nobres, sublimes, e interessantes, executadas pelo Rosso, pelo Primaticio, pelo divino [32] Raphael, por Le Brun, por Mignard, e por muitos outros sapientissimos Pintores. Rubens na Galeria do palacio de Luxemburgo, edificado por Maria de Medicis, tambem deixou em vinte e quatro paineis immortalisadada a vida daquella heroina. No primeiro, onde est representado o seu destino, apparecem as tres parcas fiando os bellos dias da futura Rainha, debaixo dos auspicios de Juno, e de Jupiter. No segundo est Lucina allumiando com a sua flamma as Graas da Princeza recem-nascida; e deposita-a entre as mos da Cidade de Florena: Os Destinos espalho sobre ella flores s mos cheias: o signo de Sagittario indica o tempo do seu nascimento: o Genio da felicidade, deixando ver a coroa, o sceptro, e as flores de liz, claramente manifesta que aquella menina nasce para ser Rainha de Frana. A Inveno dos outros quadros, que he igualmente poetica, e pittoresca, contm: a educao da Rainha: o ajuste do seu casamento com Henrique [33] IV.: O casamento effectuado: o desembarque da Rainha em Marselha: a Cidade de Lyo, que lhe sahe ao encontro: o nascimento do Delphim: Henrique IV. se dispe a partir para a guerra d'Alemanha, em soccorro dos Marquezes de Brandeburgo, e de Neuburgo: coroao da Rainha como Regente: Apotheose de Henrique IV., e Regencia da Rainha: o seu governo: viagem militar da Rainha Ponte de C, para reprimir a guerra civil: a troca das duas Rainhas, Isabel de Frana, que casou com Filippe IV., e Anna de Austria, com Luiz XIII., em 9 de Novembro de 1615: felicidade da Regencia: maioridade de Luiz XIII.: fugida da Rainha do Castello de Blois, onde seu filho a tinha presa: a Rainha acceita a paz, e a conclue com seu filho: a mesma pa IV.: O casamento effectuado: o desembarque da Rainha em Marselha: a Cidade de Lyo, que lhe sahe ao encontro: o nascimento do Delphim: Henrique IV. se dispe a partir para a guerra d'Alemanha, em soccorro dos Marquezes de Brandeburgo, e de Neuburgo: coroao da Rainha como Regente: Apotheose de Henrique IV., e Regencia da Rainha: o seu governo: viagem militar da Rainha Ponte de C, para reprimir a guerra civil: a troca das duas Rainhas, Isabel de Frana, que casou com Filippe IV., e Anna de Austria, com Luiz XIII., em 9 de Novembro de 1615: felicidade da Regencia: maioridade de Luiz XIII.: fugida da Rainha do Castello de Blois, onde seu filho a tinha presa: a Rainha acceita a paz, e a conclue com seu filho: a mesma paz confirmada no Ceo: o tempo descobrindo a Verdade. Alguns destes assumptos so assaz triviaes, e parecem estereis; mas o grande e fecundissimo Genio de Rubens soube achar [34] para todos as mais bellas imagens, que se podio desejar. seco ii. Disposio. A disposio he pr em boa ordem as idas achadas pelo genio da Inveno, a fim de compr com magisterio a scena de hum painel. Toda a composio he historica, allegorica, ou mixta: a que he historica tem por objecto representar hum facto, com as circumstancias allegadas pelos historiadores: a que he allegrica relata os acontecimentos metaforicamente; exprimindo debaixo d'hum vo figurado, hum sentido diverso da expresso literal: a mixta diz a verdade historica, ornada ou corroborada com alguma agudeza da allegoria, que lhe sirva de commento; e sem a qual no se poderia entender bem o que se quiz dizer. [35] Artigo I. Da Disposio relativa ao Grande Genero. A Inveno, diz Du Fresnoy, acha os convenientes objectos; e a Disposio os arranja; mas a distribuio ha de fazer-se de sorte, que o tom, e a scena do quadro, primeira vista, inspirem a principal paixo no animo dos espectadores: isto he, que inspire alegria se o assumpto for alegre; ou que infunda tristeza, e horror, se for triste, e horroroso. As composies sejo conforme os textos dos bons escriptores, e segundo os tempos, costumes, e naes: a licena que Horacio concede aos pintores, e aos poetas, deve ter os limites, que elle mesmo prescreve; nada de sonhos, ou delirios extravagantes. Aquelles que quizerem fazer progressos na Pintura historica, devero familiarisar-se com os livros, que podem elevar as suas idas; para, [36] nos seus vos, no se servirem de alheias azas, de que no conheo bem o uso, nem a fora. Quando se escolherem as attitudes das figuras, devem-se prever os effeitos e harmonia das luzes, e cores; para collocar tudo de hum modo natural, e vantajoso, e rejeitar o que pde fazer confuso: imitando a tragedia, irm da pintura, a qual emprega todas as foras da sua arte onde recahe o forte da aco. Para o Heroe, e para as principaes figuras, escolh-se attitudes cujos membros sejo grandiosos, amplos, e desiguaes nas suas posituras; de maneira que os de diante contrastem com os de traz, e todos sejo balanceados, ou equilibrados no seu centro commum. A principal figura apparea no meio do quadro, debaixo da mais viva luz, tendo alguma cousa notavel que a distinga de todas as outras; nem seja affrontada por alguma dellas. Os gruppos sejo separados por hum vacuo, para no fazerem confuso; [37] evitando nelles repeties de fysionomias, e movimentos; ou tendencia para a mesma parte. Entre varias figuras de frente esteja tambem alguma de lado, ou de costas: advirta-se que o pezo da composio no penda para hum s lado. Evite-se o grande numero de figuras; mas se o assumpto o pedir, attenda-se primeiramente harmonia do todo, e depois se cuidar em cada objecto; cedendo o interesse de cada hum em particular ao bem commum de todos. As figuras, que estiverem atraz de outras, no tero graa se os movimentos das mos no forem perfeitamente de acrdo com as expresses dos semblantes. Evitem-se os escoros, as aces violentas, ou pouco naturaes, e tudo quanto for desagradavel vista; como linhas parallelas, ou figuras geometricas, que pela sua regularidade fao mo effeito nas composies; porque a boa composio he huma bella desordem. [38] No vos sujeiteis tanto Natureza, que no possais fazer cousa alguma sem a ter diante dos olhos; nem a abandoneis de modo, que tudo pinteis de pratica, porque hum tal costume seria huma libertinagem anti-pittoresca. Quando o quadro tiver huma s figura, dever ella ser bellissima, e realada com vivas cores. As roupagens devem ter simplicidade, e natureza; tendo sempre atteno s qualidades das pessoas que as vestem: as dos Senadores sejo amplas; as das donzellas leves, e suaves; as dos rusticos grossas e estreitas. Para encadear as luzes, he preciso s vezes, relevar algumas dobras sobre espaos mais profundos. As divisas das virtudes, ou distinctivos das sciencias; os instrumentos de guerra, e dos sacrificios, pela sua nobreza, concorrem muito para o ornato das figuras; mas o ouro, e as joias sejo raros. Fuja-se dos ornamentos gticos; porque so outros tantos monstros produzidos nos seculos [39] infelices. As paizagens, ou architecturas nos fundos dos quadros, sejo executadas segundo o costume e natureza do seculo, nao, ou paiz da scena. He mui difficil exprimir bem as paixes d'alma; nem ellas podem ser naturaes seno nas pessoas verdadeiramente apaixonadas: he onde o Artista as deve estudar. Fazei o maior esforo para dar a tudo muita graa, e muita nobreza; mas este dom dimana antes do Ceo, que dos estudos. Leonardo de Vinci tambem nos deixou muitos, e optimos documentos sobre a Composio. Quando souberdes, diz elle, esboar bem huma figura por todos os lados, aprendei a compr; e comeai por dois combatentes de igual valor, desenhando-os em varios aspectos, e em differentes attitudes; depois fazei o valente brigando com hum cobarde, tudo bem estudado: e aproveita-te das manchas casuaes das paredes, e dos marmores, que representem frmas [40] de batalhas, e de outras cousas. Estes acasos suggerem muitas invenes fertil imaginao. Depois de conheceres bem as partes de cada membro, e a totalidade dos corpos inteiros, nota, e observa com diligencia os seus particulares movimentos; mas de modo que as gentes no entendo que as observas, para que no mudem de affectos: assim podes estudar a clera, a ira, a dor, a admirao, etc.; e tudo apontars no livro de memoria, feito de papel gessado, com ponteiro de prata; e depois o tirars a limpo para ser o teu mestre nas composies. Faze as figuras de modo, que entendamos pelas suas mos, olhos, sobrolhos, e por todos os gstos do corpo, o que nos querem dizer; como fario os mudos, ou os pantomimos para se explicarem: attendendo porm mais ou menos gravidade das pessoas que fallo, e natureza das cousas que nos dizem. O Principe, ou o sabio, tenho differena [41] das gentes vulgares; com tanto, que os tristes sempre pareo mais ou menos tristes, e os alegres alegres. Nos gruppos misturem-se objectos de todas as sortes; mulheres, homens, moos, velhos, animaes, arvores, montanhas, edificios, etc., etc.; observando com tudo, que os membros e gstos d'hum velho sejo de velho, e os de ......Buy Now (To Read More)

Product details

Ebook Number: 24833
Author: Machado, Cirilo Volkmar
Release Date: Mar 15, 2008
Format: eBook
Language: Portuguese

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