Obras Completas de Luis de Camões, Tomo III

Obras Completas de Luis de Camões, Tomo III

Obras Completas de Luis de Camões, Tomo IIIMantivemos a grafia usada na edio impressa, tendo sido corrigidos...
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Author: Camões, Luís de,1524?-1580
Format: eBook
Language: Portuguese
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Obras Completas de Luis de Camões, Tomo III

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Obras Completas de Luis de Camões, Tomo III

Mantivemos a grafia usada na edio impressa, tendo sido corrigidos alguns pequenos erros tipogrficos evidentes, que no alteram a leitura do texto, e que por isso no considermos necessrio assinal-los. Mantivemos inclusivamente as eventuais incoerncias de grafia de algumas palavras, em particular quanto acentuao. [1] Este Labyrintho, onde ninguem se entende, no parece obra do poeta. Nelle no fazemos emenda alguma, porque a unica judiciosa seria passar-lhe um trao por cima: o que no ousamos fazer por andar em todas as edies. A TRES DAMAS, QUE LHE DIZIO QUE O AMAVO. Mote. No sei se m'engana Helena, Se Maria, se Joanna; No sei qual dellas m'engana. Voltas. Huma diz que me quer bem, Outra jura que me quer; Mas em jura de mulher Quem crer, se ellas no crem? No posso no crer a Helena, A Maria, nem Joanna; Mas no sei qual mais m'engana. Huma faz-me juramentos {75} Que s meu amor estima, A outra diz que se fina, Joanna, que bebe os ventos. Se cuido que mente Helena, Tambem mentir Joanna; Mas quem mente no m'engana. oOo A HUMA DAMA MAL EMPREGADA. Mote. Menina, no sei dizer, Vendo-vos to acabada, Quo triste estou por vos ver Formosa e mal empregada. Voltas. Quem to mal vos empregou, Pouco de mi se dohia, Pois no vio o quanto me hia Em tirar-me o que tirou. Obriga o primor que tem Lindeza to extremada Que digo quantos a vem, Formosa e mal empregada! Tomastes da formosura Quanto della desejastes, E com ella me guardastes Para to triste ventura. Mataveis sendo solteira, Matais agora em casada; Matais de toda a maneira, Formosa e mal empregada. {76} oOo A HUMA Foa Gonalves. Mote. Com vossos olhos, Gonalves, Senhora, captivo tendes Este meu corao Mendes. Volta. Eu sou boa testimunha, Que Amor tem por cousa m, Que olhos, que so homens ja, Se nomeiem sem alcunha; Pois o corao apunha, E diz, olhos, pois vs tendes, Chamae-me corao Mendes. oOo OUTRO De que me serve fugir De morte, dor e perigo, Se me eu levo comigo? Voltas. Tenho-me persuadido, Por razo conveniente, Que no posso ser contente, Pois que pude ser nascido. Anda sempre to unido O meu tormento comigo, Qu'eu mesmo sou meu perigo. E se de mi me livrasse, Nenhum gsto me sera: Quem, seno eu, no teria {77} Mal, que esse bem me tirasse? Fra he logo que assi passe, Ou com desgsto comigo, Ou sem gsto e sem perigo. oOo A HUMA DAMA, QUE JURAVA PELOS SEUS OLHOS. Quando me quer enganar A minha bella perjura, Para mais me confirmar O que quer certificar, Polos seus olhos me jura. Como meu contentamento Todo se rege por elles, Imagina o pensamento, Que se faz aggravo a elles No crer to gro juramento. Porm como em casos tais Ando ja visto e corrente, Sem outros certos sinais, Quanto me ella jura mais, Tanto mais cuido que mente. Ento vendo-lhe offender Huns taes olhos como aquelles, Deixo-me antes tudo crer, S pola no constranger A jurar falso por elles. {78} oOo MOTE ALHEIO. Ha hum bem, que chega e foge; E chama-se este bem tal, Ter bem para sentir mal. Volta. Quem viveo sempre n'hum ser, Inda que seja em pobreza, No vio o bem da riqueza, Nem o mal d'empobrecer: No ganhou para perder; Mas ganhou com vida igual No ter bem, nem sentir mal. oOo A HUMA DAMA, QUE LHE VIROU O ROSTO. Mote. Olhos, no vos mereci Que tenhais tal condio, To liberaes para o cho, To irosos para mi. Volta. Baixos e honestos andais, Por vos negardes a quem No quer mais que aquelle bem, Que vs no cho espalhais? Se pouco vos mereci, No m'estimeis mais que o cho, A quem vs o galardo Dais, e mo negais a mi. {79} oOo PROPRIO. Venceo-me Amor, no o nego; Te mais fra qu'eu assaz; Que como he cego e rapaz, D-me porrada de cego. Volta. S porque he rapaz ruim, Dei-lhe hum bofte zombando. Diz-me: mao, estais me dando, Porque sois maior que mim? Pois se eu vos descarrgo, E em dizendo isto, chaz; Torna-me outra; t rapaz, Que ds porrada de cego. oOo AO DESCONCERTO DO MUNDO. Os bons vi sempre passar No mundo graves tormentos; E para mais m'espantar, Os maos vi sempre nadar Em mar de contentamentos. Cuidando alcanar assi O bem to mal ordenado, Fui mao; mas fui castigado. Assi, que s para mi Anda o mundo concertado. {80} oOo A HUMA DAMA, PERGUNTANDO-LHE QUEM O MATAVA. Mote. Perguntais-me, quem me mata? No quero responder nada, Por vos no fazer culpada. Volta. E se a penna no me atia, A dizer pena to forte, Quero-me entregar morte, Antes que a vs justia. Porm se tendes cobia De vos verdes to culpada, Direi que no sinto nada. oOo MOTE. Esconjuro-te, Domingas, Pois me ds tanto cuidado, Que me digas se te vingas, Viverei menos penado. Voltas. Juravas-me, que outras cabras Folgavas de apascentar; Eu por no me magoar, Fingia qu'ero palabras. Agora d'arte te vingas D'algum meu doudo peccado, Qu'inda que queiras, Domingas, No posso ser enganado. {81} Qualquer cousa busca o seu; A fonte vai para o Tejo, E tu para o teu desejo, Por te vingares do meu. De mi t'esqueces, Domingas, Como eu fao do meu gado: Praza a Deos, que se te vingas, Que morra desesperado. Na phantasia te pinto, Fallo-te, responde o monte, Busco o rio, busco a fonte, Endoudeo, e no o sinto: Domingas no valle brado, Responde o eco Domingas; E tu inda te no vingas De me ver doudo tornado! oOo ALHEIO. Se a alma ver-se no pde Onde pensamentos ferem, Que farei para me crerem? Voltas. Se n'alma huma s ferida Faz na vida mil sinais, Tanto se descobre mais, Quanto he mais escondida. S'esta dor to conhecida Me no vem, porque no querem, Que farei para ma crerem? {82} Se se pudesse bem ver Quanto callo, e quanto sento, Despois de tanto tormento Cuidaria alegre ser. Mas se no me querem crer Olhos, que to mal me ferem, Que farei para me crerem? oOo ALHEIO. Vosso bem querer, Senhora, Vosso mal melhor me fra. Voltas. Ja agora certo conheo Ser melhor todo tormento, Onde o arrependimento Se compra por justo preo. Enganou-me hum bom como; Mas o fim me diz agora Que o mal melhor me fra. Quando hum bem he to damnoso, Que sendo bem, d cuidado, O damno fica obrigado A ser menos perigoso. Mas se a mi por desditoso, Co'o bem me foi mal, Senhora, Co'o vosso mal bem me fra. {83} oOo ALHEIO. Se me desta terra for, Eu vos levarei, amor. Voltas. Se me for, e vos deixar, (Ponho por caso, que possa) Est'alma minha, qu'he vossa, Comvosco m'ha de ficar. Assi que s por levar A minha alma, se me for, Vos levarei, meu amor. Que mal pde maltratar-me, Que comvosco seja mal? Ou que bem pde ser tal, Que sem vs possa alegrar-me? O mal no pde enojar-me, O bem me ser maior, Se vos levar, meu amor. oOo ALHEIO. Pequenos contentamentos, Hi buscar quem contenteis, Que a mi no me conheceis. Voltas. Os gostos, que tantas dores Fizero ja valer menos, No os acceita pequenos, Quem nunca teve maiores: Bem parecem vos favores, {84} Pois to tarde me quereis, Qu'inda me no conheceis. Offereceis-me alegria, Tendo-me ja cego e mouco: He baixeza acceitar pouco, Quem tanto vos merecia. Ide-vos por outra via, Pois o bem que me deveis, Nunca mo satisfareis. oOo ALHEIO. Perdigo perdeo a penna, No ha mal que lhe no venha. Voltas. Perdigo, que o pensamento Subio a hum alto lugar, Perde a penna do voar, Ganha a pena do tormento: No te no ar, nem no vento, Azas com que se sostenha: No ha mal que lhe no venha. Quiz voar a huma alta torre, Mas achou-se desasado; E vendo-se despennado, De puro penado morre. Se a queixumes se soccorre, Lana no fogo mais lenha: No ha mal que lhe no venha. {85} oOo A HUMAS SENHORAS, QUE HAVIO SER TERCEIRAS PARA COM HUMA DAMA. Pois a tantas perdies, Senhoras, quereis dar vida, Ditosa seja a ferida, Que te taes Cirurgies! Pois ventura Me subio a tanta altura, Que me sejais valedoras, Ditosa seja a tristura, Que se cura Por vossos rogos, Senhoras! Ser minha pena mortal, Ja qu'entendeis, que he assi, No quero fallar por mi, Que por mi falla meu mal. Sois formosas, Haveis de ser piedosas, Por ser tudo d'huma cr; Que pois Amor vos fez rosas Milagrosas, Fazei milagres de Amor. Pedi a quem vs sabeis, Que saiba de meu trabalho, No pelo qu'eu nisso valho, Mas pelo que vs valeis. Que o valer De vosso alto merecer, Com lho pedir de giolhos, Fara qu'em meu padecer {86} Possa ver O poder que te seus olhos. Vossa muita formosura Com a sua tanto val, Que me rio de meu mal, Quando cuido em quem me cura. A meus ais, Peo-vos que lhe valhais, Damas de Amor to valdas, Que nunca tal dor sintais, Que queirais, Onde no sejais queridas. oOo CANTIGA ALHEIA. Na fonte est Leonor Lavando a talha, e chorando, s amigas perguntando: Vistes l o meu amor? Voltas. Psto o pensamento nelle, Porque a tudo o Amor a obriga, Cantava, mas a cantiga Ero suspiros por elle. Nisto estava Leonor O seu desejo enganando, s amigas perguntando: Vistes l o meu amor? O rosto sbre ha mo, Os olhos no cho pregados, {87} Que de chorar ja cansados, Algum descanso lhe do; Desta sorte Leonor Suspende de quando em quando Sua dor; e em si tornando, Mais pezada sente a dor. No deita dos olhos goa, Que no quer que a dor s'abrande Amor, porque em mgoa grande Scca as lagrimas a mgoa. Despois que de seu amor Soube novas perguntando, D'improviso a vi chorando. Olhae que extremos de dor! oOo ESTAS TROVAS MANDOU O AUTOR DA CADEIA, EM QUE O TINHA EMBARGADO POR HUMA DIVIDA MIGUEL ROIZ, FIOS SECOS D'ALCUNHA, AO CONDE DO REDONDO D. FRANCISCO COUTINHO, VISO-REI, QUE SE EMBARCAVA PARA FRA, PEDINDO-LHE O FIZESSE DESEMBARGAR. Que diabo ha to damnado, Que no tema a cutilada Dos fios seccos da espada Do fero Miguel armado? Pois se tanto hum golpe seu Sa na infernal cadeia; Do que o demonio arreceia Como no fugirei eu? {88} Com razo lhe fugiria, Se contr'elle, e contra tudo No tivesse hum forte escudo S em Vossa Senhoria. Por tanto, Senhor, proveja, Pois me te ao remo atado, Que antes que seja embarcado, Eu desembargado seja. oOo ESTAS TROVAS MANDOU HEITOR DA SILVEIRA AO MESMO CONDE, INVERNANDO EM GOA. Vossa Senhoria creia Que no apura o engenho Fome, se he como a que tenho, Mas afraca e corta a veia. E quem o contrrio sente, Est farto em toda a hora, Como estou faminto agora: Mas Martha, se est contente, D-lhe pouco de quem chora. E pois Vossa Senhoria Em geral a tudo acode, Acuda a mi, que s pde Dar-me no engenho valia. Esperte esta Musa minha, Que o tempo traz somnolenta; Valha-lhe nesta tormenta Com essa doce mzinha, Que s d vida e contenta. {89} Acuda com proviso, No de papel, mas provda D'ouro e prata; que esta vida No sustento papis, no. De feitor a thesoureiro Ser-me-hia trabalho grande; Vossa Senhoria mande Algum remedio, primeiro, Com que a morte o ferro abrande. Ajuda de Luis de Cames. Nos livros doutos se trata Que o grande Achilles insano Deo a morte a Heitor Troiano; Mas agora a fome mata O nosso Heitor Lusitano. S ella o pde acabar, Se essa vossa condio Liberal e singular No mete entr'elles basto, Bastante para o fartar. oOo A HUMA SENHORA, QUE LHE CHAMOU DIABO. Esparsa. No posso chegar ao cabo De tamanho desarranjo, Que sendo vs, Senhora, Anjo, Vos queira tanto o Diabo. {90} Dais manifesto sinal De minha muita firmeza, Que os diabos querem mal Aos Anjos por natureza. oOo CANTIGA. Vi chorar huns claros olhos, Quando delles me partia. Oh que mgoa! Oh que alegria! Voltas. Polo meu apartamento Se arrazro todos d'goa. Quem cuidou qu'em tanta mgoa Achasse contentamento? Julgue todo entendimento Qual mais sentir se devia, Se esta dor, se esta alegria? Quando mais perdido estive, Ento deo a est'alma minha Na maior mgoa que tinha, O maior gsto que tive. Assi, se minha alma vive, Foi porque me defendia Desta dor esta alegria? O bem, que Amor me no deu No tempo que desejei, Quando delle me apartei, Me confessou, qu'era meu. Agora que farei eu, {91} Se a fortuna me desvia De lograr esta alegria? No sei se foi enganado, Pois me tinha defendido Das ras de mal querido, No mal de ser apartado. Agora peno dobrado, Achando no fim do dia O princpio da alegria. oOo VILLANCETE PASTORIL. Deos te salve, Vasco amigo. No me fallas? Como assi? Bof, Gil, no 'stava aqui. Voltas. Pois onde te ho de fallar, Se no 'sts onde appareces? Se Magdanela conheces, Nella me pdes achar. E como te ho d'ir buscar Aonde fogem de ti? Pois nem eu estou em mi. Porque te no acharei Em ti, como em Magdanela? Porque me fui perder nella O dia que me ganhei. Quem to bem falla, no sei Como anda fra de si. Ella falla dentro em mi. {92} Como ests aqui presente, Se l tens a alma e a vida? Porqu'he d'hum'alma perdida Apparecer sempre gente. Se es morto, bem se consente Que todos fujo de ti. Eu tambem fujo de mi. oOo OUTRO PASTORIL. Porque no miras, Giraldo, Mi zampoa como suena? Porque no me mira Elena. Voltas. Vuelve ac, no ests pasmado, Mira que gentil sonar! Como te podr mirar Quien no puede ser mirado? Y que bueno enamorado! No dirs, si es mala, o buena? No, que me hizo mudo Elena. Mira tan dulce armona, Djate dessos enojos. Tengo clavados los ojos Con que mirar te podia. Ans Dios te d alegra: No vs cuan dulce que suena? No, porque no veo Elena. {93} oOo OUTRO PASTORIL. Crescem, Camilla, os abrolhos De chorares por Cincero: No he muito, que lhe quero, Belisa, mais que meus olhos. Voltas. Sempre os teus olhos esto, Camilla, d'goas banhados. De se verem desamados Pde ser que choraro. Si, mas crescem os abrolhos, E tu cegas por Cincero. S'eu no vejo quem mais quero, Para que quero mais olhos? Se se foi ha mais d'hum ms, Teus olhos no cansaro? No, que apos elle se vo Estas lagrimas que vs. Fazem logo estes abrolhos O mato espinhoso e fero. Pois eu no vejo a Cincero, Isso s vero meus olhos. Chorando queres morrer? Mais quero viver chorando. Tu no vs que vs cegando? Se cego, como hei de ver? Pe na vista outros antolhos. No posso, nem menos quero. Outra para outro Cincero, Antes no quero ter olhos. {94} oOo A HUMA MULHER, QUE SE CHAMAVA GRACIA DE MORAES. Mote. Olhos, em qu'esto mil flores, E com tanta graa olhais, Que parece que os Amores Moro onde vs morais. Volta. Vem-se rosas e boninas, Olhos, nesse vosso ver; Vem-se mil almas arder No fogo dessas meninas. E di-lo-ho minhas dores, Meus suspiros e meus ais; E diro mais, que os amores Moro onde vs morais. oOo MOTE. Quem se confia em huns olhos, Nas meninas delles v Que meninas no te f. Voltas. Quem pe suas confianas Em meninas sem assento, Offerea o soffrimento A duzentas mil mudanas. Mostro no ar esperanas; Mas em seus olhos se v Como no te n'alma f. Engano ao parecer, {95} Porque no caso d'amar, So mulheres no matar, E meninas no querer. Quem em seus olhos se crer, Cem mil graas nelles v; V-las sim, mas no ter f. Amostro-vos n'hum momento Favores assi a mlhos; Mas na mudana dos olhos Se lhe muda o pensamento. Em nada ja te assento, E o que mais nelles se v He formosura sem f. oOo LOUVANDO E DESLOUVANDO UMA DAMA. Cantiga Velha. Sois formosa, e tudo tendes, Seno que tendes os olhos verdes, Voltas. Ninguem vos pde tirar Serdes to bem assombrada; Mas heis-me de perdoar, Que os olhos no valem nada. Fostes mal aconselhada Em querer que fossem verdes: Trabalhae de os esconderdes. A vossa testa he jardim, Onde Amor se desenfada; He to branca e bem talhada, Que parece de marfim. {96} Assi he; e quanto a mim, Isso vos nasce de a terdes To perto dos olhos verdes. Os cabellos desatados O mesmo sol escurecem; Seno que por ser ondados, Algum tanto desmerecem: Mas f, que se parecem A furto dos olhos verdes, No vos peze, no, de os terdes. As pestanas te mostrado Ser raios, que abrazo vidas: Se no foro to compridas, Tudo o mais era pintado: Ellas me tinho levado A alma, sem o vs saberdes, Se no foro os olhos verdes. O mimo desse caro Nem pr-lhe os olhos consente: O ser liso e transparente Rouba todo o corao: Inda assi achareis nao, Que lhe no peze de os verdes; Mas no seja co'os olhos verdes. Esse riso, que he compsto De quantas graas nascro, Seno que alguns me dissero, Vos faz covinhas no rsto. Na vontade tenho posto Dar-vos a alma, se quizerdes, A trco dos olhos verdes. {97} Nunca se vio, nem se escreve Boca co'huma graa igual, Se no fra de coral, E os dentes de cr de neve. Dou-me eu a Deos, que me leve! Soffrerei quanto tiverdes, No me tenhais olhos verdes. Essa garganta merece Outras palavras no minhas, Seno qu'he feita em rosquinhas D'alfenim, ao que parece. Eu sei bem quem se offerece A tomar tudo o que tendes, E tambem os olhos verdes. Essas mos so ferropeas: S o v-las enfeitia; Seno que so alvas, cheias, E te a feio rolia; Com que appellais por justia, Para com ellas prenderdes Quem v vossos olhos verdes. A vossa galantaria Matar a quem fallardes: Tendes huns desdens e tardes, Que eu logo vos roubaria. Oh dou-me a Santa Maria! Sou cujo de quanto tendes, E tambem desses olhos verdes. {98} oOo AO MESMO. Tudo tendes singular, Com que os coraes rendeis, Seno que rindo, fazeis Covinhas para enterrar: E para resuscitar Te fora a graa que tendes; Seno que tendes os olhos verdes. Tudo, Senhora, alcanais, Quanto o ser formosa alcana, Seno que dais esperana Co'os olhos com que matais. Se acaso os alevantais, He para as almas renderdes; Seno que tendes os olhos verdes. oOo A DOM ANTONIO, SENHOR DE CASCAES, QUE TENDO-LHE PROMETTIDO SEIS GALLINHAS RECHEADAS POR HUMA COPLA QUE LHE FIZERA, LHE MANDOU POR PRINCPIO DA PAGA MEIA GALLINHA RECHEADA. Cinco gallinhas e meia Deve o Senhor de Cascais; E a meia vinha cheia De appetite para as mais. {99} oOo MOTE. Catharina bem promette; Ora m! como ella mente! Voltas. Catharina he mais formosa Para mi, que a luz do dia; Mas mais formosa sera, Se no fosse mentirosa. Hoje a vejo piedosa, manha to differente, Que sempre cuido que mente. Prometteo-me hontem de vir, Nunca mais appareceo; Creio que no prometteo, Seno s por me mentir. Faz-me, emfim, chorar e rir; Rio, quando me promette, Mas chro quando me mente. Jurou-me aquella cadella De vir, pela alma que tinha; Enganou-me; tinha a minha; Deo-lhe pouco de perdella. A vida gasto apos ella, Porque ma d, se promette, Mas tira-ma, quando mente. M, mentirosa, malvada, Dizei, porque me mentis? Prometteis, e ento fugis? Pois sem tornar, tudo he nada. No sois bem aconselhada; {100} Que quem promette, se mente, O que perde no o sente. Tudo vos consentiria Quanto quizesseis fazer, Se este vosso prometter Fosse por me ter hum dia. Todo ento me desfaria Com gsto; e vs de contente, Zombarieis de quem mente. Mas pois folgais de mentir, Promettendo de me ver, Eu vos deixo o prometter, Deixae-me vs o servir: Haveis ento de sentir Quanto a minha vida sente O servir a quem lhe mente. Catharina me mentio Muitas vezes, sem ter lei, E todas lhe perdoei Por huma s que cumprio. Se como me consentio Fallar-lhe, o mais me consente, Nunca mais direi que mente. oOo MOTE. A alma, qu'est offrecida A tudo, nada lhe he forte; Assi passa o bem da vida, Como passa o mal da morte. {101} Volta. De maneira me succede O que temo, e o que desejo, Que sempre o que temo, vejo, Nunca o que a vontade pede. Tenho to offerecida Alma e vida a toda a sorte, Que isso me dera da morte, Como ja me d da vida. oOo MOTE. Ferro, fogo, frio e calma, Todo o mundo acabaro; Mas nunca vos tiraro, Alma minha, da minha alma. Volta. No vos guardei, quando vinha, Em trre, fra, ou engenho; Que mais guardada vos tenho Em vs, que sois alma minha. Alli nem frio, nem calma, No podem ter jurdio; Na vida sim, porm no Em vs que tenho por alma. oOo MOTE. Esperei, ja no espero De mais vos servir, Senhora; {102} Pois me fazeis cada hora Tanto mal, que desespro. Volta. Pois sei certo que folgais, Quando mais mal me fazeis, E que nunca descansais, Seno quando me mostrais Quo pouco bem me quereis; Servir-vos mais no espero Pois meu viver empeora Com me fazerdes, Senhora, Tanto mal, que desespro. oOo MOTE. Descala vai para a fonte Leonor pela verdura; Vai formosa, e no segura. Voltas. Leva na cabea o pote, O testo nas mos de prata, Cinta de fina escarlata, Sainho de chamalote: Traz a vasquinha de cote, Mais branca que a neve pura; Vai formosa, e no segura. Descobre a touca a garganta, Cabellos de ouro entranado, Fita de cr d'encarnado, To linda que o mundo espanta: Chove nella graa tanta, {103} Que d graa formosura; Vai formosa, e no segura. oOo MOTE. Quem disser que a barca pende, Dir-lhe-hei, mana, que mente. Voltas. Se vos quereis embarcar, E para isso estais no caes, Entrae logo: que tardaes? Olhae qu'est preamar: E se outrem, por vos fretar, Vos disser qu'esta que pende, Dir-lhe-hei, mana, que mente. Esta barca he de carreira; Te seus apparelhos novos: No ha como ella outra em Povos Boa de leme, e veleira: Mas, se por ser a primeira, Vos disser alguem que pende, Dir-lhe-hei, mana, que mente. oOo MOTE. Com razo queixar-me posso De vs, que mal vos queixais; Pois, Senhora, vos sangrais, Que seja n'hum corpo vosso. {104} Voltas. Eu para levar a palma, Com que ser vosso merea, Quero que o corpo padea Por vs, que delle sois alma. Vs do corpo vos queixais, Eu queixar-me de vs posso, Porque, tendo hum corpo vosso, Na minha alma vos sangrais. E sem fazer differena No que de mi possuis, Pelo pouco que sentis, Dais minh'alma doena. Porque dous aventurais? Oh no seja o damno nosso! Sangre-se este corpo vosso, Porque, minha alma, vivais. E inda, se attentardes bem, Seguis medicina errada, Porque para ser sangrada Hum'alma sangue no tem. E pois em mi sarar posso Males, que minha alma dais, Se inda outra vez vos sangrais, Seja neste corpo vosso. oOo MOTE. Ojos, herido me habeis, Acabad ya de matarme; {105} Mas muerto volved mirarme, Porque me resusciteis. Voltas. Pues me distes tal herida, Con gana de darme muerte, El morir me es dulce suerte, Pues con morir me dais vida. Ojos, qu os deteneis? Acabad ya de matarme; Mas muerto volved mirarme, Porque me resusciteis. La llaga cierto ya es mia, Aunque, ojos, vs no querrais; Mas si la muerte me dais, El morir me es alegra. Y as digo que acabeis, O ojos, ya de matarme; Mas muerto volved mirarme, Porque me resusciteis. oOo A DONA FRANCISCA DE ARAGO, QUE LHE MANDOU GLOSAR ESTE VERSO: Mas porm a que cuidados? Tanto maiores tormentos Foro sempre os que soffri, Daquillo que cabe em mi, Que no sei que pensamentos So os para que nasci. {106} Quando vejo este meu peito A perigos arriscados Inclinado, bem suspeito Que a cuidados sou sujeito, Mas porm a que cuidados? Ao mesmo. Que vindes em mi buscar, Cuidados, que sou captivo? Eu no tenho que vos dar: Se vindes a me matar, Ja ha muito que no vivo: Se vindes, porque me dais Tormentos desesperados, Eu, que sempre soffri mais, No digo que no venhais; Mas porm a que cuidados? Ao mesmo. Se as penas que Amor me deu, Vem por to suaves meios, No ha que temer receios; Que val hum cuidado meu Por mil descansos alheios. Ter n'huns olhos to formosos Os sentidos enlevados, Bem sei qu'em baixos estados So cuidados perigosos; Mas porm a que cuidados?... Carta com a glosa acima. Deixei-me enterrar no esquecimento de v. m. crendo me sera assi mais seguro: mas agora que he {107} servida de me tornar a resuscitar, por me mostrar seus poderes, lembro-lhe que huma vida trabalhosa he menos de agradecer, que huma morte descansada. Mas se esta vida, que agora de novo me d, for para ma tornar a tomar, servindo-se della, no me fica mais que desejar, que poder acertar com este mote de v. m., ao qual dei tres entendimentos, segundo as palavras delle pudro soffrer: se forem bons, he mote de v. m.: se maos, so as glosas minhas. oOo MOTE ALHEIO. Campos bem-aventurados, Tornae-vos agora tristes; Que os dias, em que me vistes, Alegres ja so passados. Glosa. Campos cheios de prazer, Vs qu'estais reverdecendo, Ja m'alegrei com vos ver; Agora venho a temer Qu'entristeais em me vendo. E pois a vista alegrais Dos olhos desesperados, No quero que me vejais, Para que sempre sejais, Campos, bem-aventurados. Porm se por accidente Vos pezar de meu tormento, Sabereis que Amor consente {108} Que tudo me descontente, Seno descontentamento. Por isso vs, arvoredos, Que ja nos meus olhos vistes Mais alegria, que medos, Se mos quereis fazer ledos, Tornae-vos agora tristes. Ja me vistes ledo ser, Mas despois que o falso Amor To triste me fez viver, Ledos folgo de vos ver, Porque me dobreis a dor. E se este gsto sobejo De minha dor me sentistes, Julgae quanto mais desejo As horas que vos no vejo, Que os dias em que me vistes. O tempo, qu'he desigual, De seccos, verdes vos tem; Porqu'em vosso natural Se muda o mal para o bem, Mas o meu para mor mal. Se perguntais, verdes prados, Pelos tempos differentes Que de Amor me foro dados, Tristes, aqui so presentes, Alegres, ja so passados. {109} oOo MOTE ALHEIO. Trabalhos descansario Se para vs trabalhasse; Tempos tristes passario, Se algum'hora vos lembrasse. Glosa. Nunca o prazer se conhece, Seno despois da tormenta: To pouco o bem permanece, Que se o descanso florece, Logo o trabalho arrebenta. Sempre os bens se logrario, Mas os males tudo atalho; Porm ja que assi porfio, Onde descansos trabalho, Trabalhos descansario. Qualquer trabalho me fra Por vs gro contentamento: Nada sentira, Senhora, Se vra disto algum'hora Em vs hum conhecimento. Por mal que o mal me tratasse, Tudo por bem tomaria; Postoque o corpo cansasse, A alma descansaria, Se para vs trabalhasse. Quem vossas cruezas ja Soffreo, a tudo se poz; Costumado ficar; E muito melhor ser, Se trabalhar para vs. {110} Tristezas esquecerio, Postoque mal me tratro; Annos no me lembrario, Que como est'outros passaro, Tempos tristes passario. Se fosse galardoado Este trabalho to duro, No vivra magoado. Mas no o foi o passado, Como o ser o futuro? De cansar no cansaria, Se quizereis, que cansasse; Cavar, morrer, fa-lo-hia; Tudo, emfim, esqueceria, Se algum'hora vos lembrasse. oOo MOTE ALHEIO. Triste vida se me ordena, Pois quer vossa condio Que os males, que dais por pena, Me fiquem por galardo. Glosa. Despois de sempre soffrer, Senhora, vossas cruezas, A pezar de meu querer, Me quereis satisfazer Meus servios com tristezas. Mas, pois em balde resiste Quem vossa vista condena, {111} Prestes estou para a pena; Que de galardo to triste Triste vida se me ordena. De contente do mal meu A to grande extremo vim, Que consinto em minha fim: Assi que vs e mais eu, Ambos somos contra mim. Mas que soffra meu tormento, Sem querer mais galardo, No he fra de razo Que queira meu soffrimento, Pois quer vossa condio. O mal, que vs dais por bem, Esse, Senhora, he mortal; Que o mal, que dais como mal, Em muito menos se tem, Por costume natural. Mas porm nesta victoria, Que comigo he bem pequena, A maior dor me condena A pena, que dais por gloria, Que os males, que dais por pena. Que mor bem me possa vir, Que servir-vos, no o sei. Pois que mais quero eu pedir, Se quanto mais vos servir, Tanto mais vos deverei? Se vossos merecimentos De to alta estima so, Assaz de favor me do {112} Em querer que meus tormentos Me fiquem por galardo. oOo MOTE ALHEIO. Ja no posso ser contente, Tenho a esperana perdida; Ando perdido entre a gente, Nem morro, nem tenho vida. Glosa. Despois que meu cruel Fado Destruio huma esperana, Em que me vi levantado, No mal fiquei sem mudana, E do bem desesperado. O corao, que isto sente, sua dor no resiste, Porque v mui claramente Que pois nasci para triste, Ja no posso ser contente. Por isso, contentamentos, Fugi de quem vos despreza: Ja fiz outros fundamentos, Ja fiz senhora a tristeza De todos meus pensamentos. O menos que lh'entreguei, Foi esta cansada vida: Cuido que nisto acertei, Porque de quanto esperei Tenho a esperana perdida. {113} Acabar de me perder Fra ja muito melhor; Tivera fim esta dor, Que no podendo mor ser, Cada vez a sinto mor. De vs desejo esconder-me, E de mi principalmente, Onde ninguem possa ver-me; Que pois me ganho em perder-me, Ando perdido entre a gente. Gostos de mudanas cheios, No me busqueis, no vos quero: Tenho-vos por to alheios, Que do bem que no espero, Inda me fico receios. Em pena to sem medida, Em tormento to esquivo Que morra, ninguem duvda; Mas eu se morro, ou se vivo, Nem morro, nem tenho vida. oOo A HUMA DAMA, QUE SE CHAMAVA ANNA. Mote. A morte, pois que sou vosso, No a quero; mas se vem, Ha de ser todo meu bem. Glosa. Amor, qu'em meu pensamento Com tanta f se fundou, {114} Me te dado hum regimento, Que quando vir meu tormento Me salve com cujo sou. E com esta defenso, Com que tudo vencer posso, Diz a causa ao corao: No te em mi jurdio A morte, pois que sou vosso. Por exprimentar hum dia Amor se me achava forte Nesta f, como dizia, Me convidou com a morte, S por ver se a temeria. E como ella seja a cousa Onde est todo meu bem, Respondi-lhe, como quem Quer dizer mais, e no ousa: No a quero, mas se vem... No disse mais, porque ento Entendeo quanto me toca; E se tinha dito o no, Muitas vezes diz a boca, O que nega o corao. Toda a cousa defendida Em mais estima se tem: Por isso he cousa sabida, Que perder por vs a vida Ha de ser todo meu bem. {115} oOo MESMA DAMA. Vejo-a n'alma pintada, Quando me pede o desejo O natural que no vejo. Glosa. Se s de ver puramente Me transformei no que vi, De vista to excellente Mal poderei ser ausente, Em quanto o no for de mi. Porque a alma namorada A traz to bem debuxada, E a memoria tanto voa, Que se a no vejo em pessoa, Vejo-a n'alma pintada. O desejo, que s'estende Ao que menos se concede, Sbre vs pede e pretende, Como o doente que pede O que mais se lhe defende. Eu, qu'em ausencia vos vejo, Tenho piedade e pejo De me ver to pobre estar, Qu'ento no tenho que dar, Quando me pede o desejo. Como quelle que cegou, He cousa vista e notoria, Que a natureza ordenou Que se lhe dobre em memoria O qu'em vista lhe faltou: Assi a mi, que no vejo {116} Co'os olhos o que desejo, Na memoria e na firmeza Me concede a natureza O natural que no vejo. oOo MOTE ALHEIO. Sem vs, e com meu cuidado, Olhae com quem, e sem quem. Glosa. Vendo Amor que com vos ver Mais levemente soffria Os males que me fazia, No me pde isto soffrer; Conjurou-se com meu Fado; Hum novo mal me ordenou: Ambos me levo forado, No sei onde, pois que vou Sem vs e com meu cuidado. No sei qual he mais estranho Destes dous males que sigo, Se no vos ver, se comigo Levar imigo tamanho. O que fica, e o que vem, Hum me mata, outro desejo: Com tal mal, e sem tal bem, Em taes extremos me vejo: Olhae com quem, e sem quem! oOo AO MESMO. Amor, cuja providencia Foi sempre que no errasse, {117} Porque n'alma vos levasse, Respeitando o mal d'ausencia, Quiz qu'em vs me transformasse. E vendo-me ir maltratado, Eu e meu cuidado ss ......Buy Now (To Read More)

Product details

Ebook Number: 37192
Author: Camões, Luís de
Release Date: Aug 24, 2011
Format: eBook
Language: Portuguese

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